[pausa] Idéias em si.



"Dispenso-a de comparecer na minha idéia de si".
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Pessoa.
(Foto: Minha-comigo-nela/Chamonix-FR)

Sabe, chegamos àquele lugar onde o silêncio é esquina de mais nada. Ficamos tanto tempo afirmando rotinas e traçando roteiros que não sobrou mais espaço no papel para o improviso. Tinta de caneta, certeza fácil: rua do cansaço, sem número. Sequer me importo de dormir na calçada.

A roleta do cassino de tudo que se passou não traz vencedores: nenhum número coincide com as apostas. Que arrogância isso de achar que está tudo aí, sob as vistas. Que infantilidade isso de querer fechar o livro da vida com promessas. O infinito não cabe nem é circunferência de dedo algum. Na verdade, as mãos devem estar limpas quando se lançam os dados.

"Para sempre" muitas vezes é desculpa de "não consigo". Se este é o exato momento de toda minha vida, eu juro que não entendo essa mania de não-agora: antes fosse ou melhor depois? Bah! Tem gente que brinca com o sério. Cada segundo é uma pergunta. Tic-da batida-tac do melhor a ser feito. Mas não, todo mundo é físico quântico. O tempo virou uma dimensão qualquer, quarta-outra que seja, abrigo da mediocridade. Todavia, vivemos em três e morremos em dois planos: antes em pé do que mal deitado. Este o mais científico de todos os fatos.

Então, no meu hoje em dia não há muito espaço para pretensões. Cada dia que passa eu imagino que diminuis tuas convicções de ontem e te largas em mania de asteróide: ironia, já que o planeta-em-dúvida devia ser eu, o para lá de urano. Todavia, sigo em órbita teimosa, apesar de último, e por mais que a sabedoria atualizadíssima insista em me desqualificar, digo que não me importo: sou qualquer coisa melhor do que "pedra gelada". O resto daquilo que me é predicado deixo para a polêmica da boca-miúda.

Quietismo estético, porque eu realmente não tenho nada a dizer. O que digo, digo para ouvido mouco, outro que não sabe dos bois, quanto mais de nomes. A si, deixo o direito de não comparecer. Na verdade, nova ironia, porque nunca precisamos de tais expedientes: desde que o fim começou, tiraste férias de qualquer extrema unção. Fiquei como no conto do alemão-louco: a carregar cadáver. O pior de tudo estava por mim.

Mas isso é o que se fez daquilo que não se sabe o que era para ter sido. Ou seja, está na categoria do "foi-se". Se te cedi direito, exigi de mim dever: arremessar-me para além de antanho. É... digamos que prefiro mais um "para agora" do que um "para sempre" nos dias que me seguem.

Era isso. Acho que cheguei naquele lugar onde a minha vida é cruzamento com a enorme vontade do melhor. Aprendi a conviver só com o curto-médio em prazo. Longo só os desejos, e esses, diz filosofia antiga, são a causa de todo o sofrimento.

Finalizo tranqüilamente dispensando-me de comparecer também em qualquer idéia de si. Prefiro a calma da periferia.

Aquele abraço.

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