Nossa Dívida para com o Selvagem.



"Vivemos sobre os alicerces construídos pelas gerações anteriores e só muito vagamente podemos compreender os penosos e prolongados esforços que custou à humanidade atingir o ponto, não muito elevado afinal de contas, a que chegamos. (...). O volume de conhecimentos novos que uma época ou certamente que um homem podem acrescentar ao fundo comum é pequeno, e seria estupidez ou desonestidade, além de ingratidão, ignorar o todo, valorizando apenas a pequena contribuição que pode ter sido nosso privilégio trazer. (...). Desprezo e ridículo, ou aversão e denúncia, são, com demasiada freqüência, o único reconhecimento concedido ao selvagem e ao seu modo de ser. Não obstante, entre os benfeitores que estamos prontos a louvar agradecidos, muitos, talvez a maioria, foram selvagens. Pois, feitas as contas, nossas semelhanças com o selvagem ainda são mais numerosas do que as nossas diferenças. (...) A reflexão e a pesquisa nos devem demonstrar que temos, para com os nossos predecessores, uma dívida em relação a muita coisa que consideramos como nossa, e que seus erros não eram extravagâncias intencionais ou delírios de insanidade, mas simplesmente hipóteses, que, como tais, se justificavam na época em que foram propostas (...). Afinal de contas, o que chamamos de verdade é apenas a hipótese que se supões funcionar melhor. Portanto, ao exarminarmos as opiniões e práticas de épocas e raças mais rudes, bem faríamos em olhar com tolerância (...) e em conceder-lhes o benefício (...) de que nós mesmos talvez necessitemos algum dia: cum excusatione itaque veteres audiendi sunt. [1]"

- Frazer: O Ramo de Ouro.
(Foto: Minha/ pata da "Preta": esfinge que ladra e morde.)

1 - "Com a mesma indulgência os antigos devem ser ouvidos".

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